Seis cartas de amor – edição #1
Sobre a primeira paixão, o desejo que embriaga, e o amor que começa na alma
Oi, amor(a).
Hoje começo com você um novo quadro aqui na nossa newsletter. Um quadro sobre o amor — mas não só aquele de post de Dia dos Namorados. Quero falar de amor em todas as suas formas: romântico, platônico, familiar, espiritual. Amor que confunde. Amor que atravessa. Amor que salva e também amor que parte a gente no meio.
Durante seis dias, vamos nos encontrar aqui pra conversar sobre os seis tipos de amor que os gregos antigos nomearam. E hoje, começamos com Eros — o amor do desejo, da paixão, do arrepio na espinha.
E pra isso, eu preciso voltar no tempo. Voltar pra uma sala de aula, pra a primeira menina que me apaixonei e um perfume que até hoje mora na minha memória.
O que é Eros?
Eros é o amor da pele, do arrepio, do toque.
É o nome do deus grego do desejo, do amor, da atração. Eros não é só sobre corpo — é sobre aquele impulso de querer entrar dentro do outro. É aquele amor que às vezes começa no olhar e termina numa obsessão, ou numa saudade eterna.
É um amor que pode ser lindo, mas também caótico. Porque ele mostra tudo que a gente sente com o corpo antes de entender com a mente. Simboliza o amor romântico e erótico, aquele que mistura desejo físico e vínculos emocionais tão profundos que quase doem. Não se trata apenas de atração, é uma vontade de se fundir no outro, de sentir cada respiração, cada olhar, cada toque. É uma entrega que pode nos elevar – ou nos despedaçar.
Quando o corpo ama primeiro — minha primeira grande paixão
A primeira vez que eu senti Eros, eu só queria saber do cheiro dela me deixava tonta.
Clarissa era a minha melhor amiga no colégio católico onde a gente estudava. A gente tinha o mesmo gosto pra tudo, vivia grudada, compartilhava de um mundo só nosso. Naquele tempo, eu ainda me via como “garota cis” e nem sequer tinha mapeado minha própria identidade de gênero. Ainda assim, tudo nela me chamava: o jeito como ela falava, a doçura dos toques, e, principalmente, o perfume dela. Era um cheiro que me deixava “bêbada” de emoção, meu corpo inteiro respondia como se ela fosse feita do mesmo ar que eu precisava respirar.
Eu juro, até hoje, anos depois, eu sinto esse cheiro às vezes no ar — e eu não sei nem o nome do perfume porque nunca tive coragem de perguntar.
Ela era minha amiga, mas também era o amor da minha vida naquele momento, e isso me assustava pra caralho. O que eu sentia não era só carinho. Era vontade de beijar, de tocar, de me fundir com ela. Só que eu não sabia como lidar com isso, era como amar com os olhos fechados, sentindo tudo, sem saber nomear nada.
A gente nunca se assumiu, nunca se falou sobre isso. E quando eu me declarei como alguém que ama livre, a família dela descobriu (não sei como), eu troquei de escola e a gente nunca mais se falou.
Mas até hoje, eu amo ela. De um jeito calmo e dolorido ao mesmo tempo. Um amor que ficou suspenso no tempo. Um amor que talvez tenha sido o primeiro a me mostrar que amar alguém é também querer existir junto.
Eros também é o que eu sinto agora
Hoje, eu olho pra minha relação com o Igor — meu namorado — e sinto algo parecido, mas diferente. Sinto uma conexão de alma, mas agora com acolhimento, com espaço pra descobrir, pra sentir sem medo.
Eu amo o Igor de um jeito que me atrai, mas que também me cura. A gente se descobre junto, a gente se toca com cuidado, a gente sente o desejo sem culpa.
E pra chegar até aqui, eu precisei me amar primeiro, me explorar, tocar meu próprio corpo com carinho. Entender meus limites, meus prazeres, minhas vontades. Hoje, meu corpo responde com a mesma gana de antes, mas sem me ferir. Descubro junto com meu parceiro novas formas de perder e encontrar a mim mesma naquele “quase beijo”, naquele abraço interminável. É um amor que tem sabor de confiança.
Eros, então, é…
…aquele amor que faz a gente tremer.
É quando o toque é mais do que físico — é quando ele atravessa a alma.
É quando a gente quer beijar, mas também quer existir com a pessoa.
É intenso. É bonito. E às vezes machuca.
Mas é real.
E foi real pra mim, com Clarissa.
E é real agora, com Igor.
E eu sou grata por ter sentido isso. Por ter amado assim.
Eros nos lembra que amar é, às vezes, aprender a dançar no fio da navalha entre vício e liberdade. Entre me entregar sem reservas e preservar nosso próprio eixo. Amar com Eros é aceitar que o corpo deseja, o coração anseia, e a alma arde – e que tudo isso faz parte de sermos humanos.
E você, qual foi o amor que te embriagou pela primeira vez? Você já se apaixonou por uma amiga, por alguém que parecia inalcançável? Como você lida com o desejo hoje?
A gente segue amanhã com Philia, o amor da amizade verdadeira.
Mas hoje, se permita lembrar de quem te fez sentir desejo pela primeira vez, se permita tocar na ferida, se ela ainda existir e se permita olhar com ternura pra quem você era quando tudo isso começou.
Feliz dia do amor!
Por amor(a), sempre.